* Dr. Marco Aurélio Ferreira
A Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) vem sendo palco de uma intensa guerra desde o fim de 2023. No episódio mais atual, o ministro Cristiano Zanin, do STF, suspendeu os efeitos da sua própria decisão liminar que barrou a desoneração da folha de pagamento de 17 setores produtivos, por 60 dias, a contar de 17/05/2024.
Fazendo um retrospecto da questão, a desoneração da folha de pagamentos foi introduzida por meio da MP 540/2011, convertida na Lei nº 12.546/2011 e, inicialmente, abrangia 17 setores, como construção civil, tecnologia da informação e comunicação, têxtil, confecção e vestuário, calçados, entre outros.
Como a desoneração da folha estava programada para terminar em 31/12/2023, o Congresso apresentou o Projeto de Lei nº 334/2023, propondo a extensão do benefício. Todavia, em 11/2023, o Executivo Federal vetou a proposta e, como resposta, em um claro embate entre os Poderes, o Congresso Nacional rejeitou o veto presidencial, promulgando a Lei 14.784/2023 e estendendo o benefício da desoneração até 2027.
O Executivo Federal, não aceitando a derrota, adotou duas posições: (i) publicou a MP 1.202/2023 que, entre outras determinações, propunha a retomada gradual da carga tributária sobre 17 setores econômicos; e (ii) judicializou a promulgação da Lei 14.784/2023 por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade 7633.
Na primeira decisão do STF, o Ministro Cristiano Zanin concedeu uma medida liminar suspendendo a Lei 14.784/2023. O caso foi a referendo do Plenário e o julgamento foi paralisado por pedido de vista do Ministro Luiz Fux. Quando a análise foi interrompida, quatro ministros já haviam seguido Zanin pela suspensão de trechos da lei.
Todavia, em 17/05/2024, o Ministro Relator atendeu a uma solicitação da Advocacia-Geral da União para que os efeitos da decisão fossem suspensos. Assim, o Ministro concedeu 60 dias para que o Executivo e o Congresso cheguem a um acordo no que diz respeito à prorrogação da sistemática de tributação.
Ocorre que, a despeito do que está sendo negociado nas instâncias superiores, a própria decisão do Ministro toca em assuntos como segurança jurídica e previsibilidade no ambiente tributário brasileiro, uma vez que os contribuintes realizaram um juízo de previsibilidade no início do exercício financeiro, ajustando suas estratégias de tributação com base no regime então vigente e em suas condições econômicas, seja optando pela CPRB ou pela Contribuição Previdenciária sobre a Folha de Salários.
E o que vem acontecendo, de modo positivo, é que contribuintes que seriam beneficiados pela desoneração se articularam em torno de medidas judiciais visando mitigar os danos e ter a anterioridade nonagesimal respeitada.
Já há precedentes em que, sob o entendimento de que a Constituição e as normas de tributação estabelecem que os estados e os municípios não podem efetuar a cobrança de impostos nos 90 dias posteriores à publicação da lei que os instituiu ou que aumentou seu valor, houve a suspensão liminar da cobrança de imposto de uma empresa cuja alíquota de contribuição sobre a folha de pagamentos ficou maior a partir da decisão do ministro Cristiano Zanin.
Essa articulação é extremamente recomendada, uma vez que os contribuintes não podem ficar reféns de um acordo a ser alcançado entre os Três Poderes, correndo o risco de serem imediatamente tributados na hipótese de uma solução não ser alcançada, o que, para algumas empresas, pode alcançar uma diferença de tributação milionária em apenas um mês de incidência.
E reforça-se o entendimento de que o sistema jurídico deve proporcionar a busca pela segurança jurídica e pela estabilidade, promovendo um ambiente de negócios saudável e para garantir o respeito aos direitos e ao patrimônio dos contribuintes.
*Dr. Marco Aurélio Ferreira, advogado e sócio da Martinho & Alves Advogados nas áreas de Direito Tributário e Agronegócios.