Mia Couto e Fernando Anitelli (Foto: Sté Frastechi)

O registro poético e olhar humano foram traços marcantes da fala do escritor, que é homenageado por esta edição da Feira Internacional do Livro e Leitura de Ribeirão Preto. De forma on-line, ele participou da Conferência principal deste domingo (22/8), direto de sua casa, em Maputo, capital de Moçambique, a partir das 16h30 (horário de Brasília). A mediação foi do artista brasileiro Fernando Anitelli, ao lado de uma plateia virtual interativa

Ribeirão Preto (SP), 23 de agosto de 2021 - Conhecido mundialmente por uma prosa entremeada por palavras inventadas, híbridas e pela narrativa cadenciada pela poesia, o escritor moçambicano Mia Couto foi a grande atração deste domingo (22) na 20ª FIL - Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto. A abertura da Conferência contou com homenagem da Fundação do Livro e Leitura (instituição realizadora do evento) prestada por Fernando Anitelli, ícone da música e da poesia brasileira, que apresentou a performance “Visitação ao Impossível” – um pocket show com espaço para música, declamação poética e o relato pessoal do artista, direto do palco do Theatro Pedro II, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.

Com transmissão ao vivo para pessoas de várias localidades, a atividade aconteceu a partir das 16h30 (horário de Brasília), com cinco horas de diferença entre a Feira e o autor, já que Mia Couto participou direto sua casa, em Maputo, capital de Moçambique, na presença de uma plateia virtual interativa.

Após apresentar ao público da Feira a sua pluralidade artística com violão e voz, Anitelli mediou a conversa com o escritor e interagiu com o público. O artista disse que poder estar na FIL e conversar com Mia Couto “foi uma das possibilidades de alegria nesta travessia pandêmica”. E confessou: “esse momento é um dos mais incríveis da minha vida, quem me conhece sabe”.

Unidos pela distância provocada pela recente crise sanitária mundial, os dois tiveram uma conversa que tocou em temas como a escrita, a autopercepção do escritor, a sua relação com os animais e a natureza – já que ele também é biólogo, bem como a paixão que alimenta pelo Brasil, entre vários outros.

Com uma timidez discreta, Mia Couto iniciou sua fala agradecendo a homenagem que recebeu da FIL. Para ele, não se trata de uma homenagem a um escritor por si só, “mas feita uns aos outros”.

Reflexões e revelações

Durante a Conferência, Fernando Anitelli quis ouvir se o autor sabe quem ele é, e a resposta veio com o relato de uma experiência, já que escreve atualmente a história de um homem que se aproxima dos outros e pergunta: - Você sabe quem eu sou? “Todos pensam que ele está sendo arrogante, mas na verdade essa pessoa não sabe quem é ela. É uma pergunta ingênua, de quem procura a sua própria identidade. E eu sou essa pessoa no fundo”, contou.

Mia Couto revelou que sabe melhor de si mesmo quando não pensa. “Sou um tradutor de várias entidades que existem dentro de mim, desta grande multidão que me ocupa. Para ser totalmente eu, tenho que ser muitos”.

Apesar da sua porção de biólogo latente, o autor homenageado foi além das teorias sobre a vida e o confronto do homem consigo mesmo. “Nos disseram que a identidade verdadeira está no nosso DNA, que é singular e única. E, por isso, temos medo da pluralidade, de não termos uma essência única. Penso que é necessário esse enfrentamento: sermos simples para traduzirmos a nossa complexidade”.

Mia Couto decifrou a literatura como não necessariamente um objeto físico, como um livro, e disse que o fazer literário está nas conversas. “Existe esse convite, essa tentação de nos identificarmos com um corpo, mas, somos feitos de trocas, transportamos histórias e essas histórias são feitas do entrosamento de outras vidas e outras histórias”.

Citando a capacidade inventiva do escritor e sua facilidade de transitar no ritmo musical das palavras, Fernando Anitelli perguntou se ele nunca pensou em fazer música.

“Eu penso na música. A música que não pensa em mim, mas não me sinto tão afastado do fazer musical. Procuro encontrar um ritmo nos meus textos, como numa partitura”. Diante do relato, veio o convite do compositor para os dois fazerem uma música juntos. O aceite foi imediato: “...Amanhã já”, brincou. A ideia foi lançada na FIL.

O escritor e a escrita

Mia Couto explicou ao público da FIL como ele dribla a realidade tão difícil do momento atual para conseguir se inspirar a novas histórias com uma citação: “Eu desvalorizei as paredes” – essa foi a mesma resposta que deu o revolucionário vietnamita, Ho Chi Minh [1890-1969], presidente do Vietnã, quando lhe perguntaram como ele foi capaz de produzir uma obra tão delicada estando na prisão. “Na verdade, ele nunca esteve preso. Isso é sempre possível se não ficarmos presos a uma versão do que nos é entregue”.

O autor ensinou que a escrita não começa sobretudo na escrita. “Começa no modo de viver, ela nos permite apagar a luz de nós mesmos e sermos os outros”, destacou.

Para ele, tanto no Brasil como em Moçambique, há uma fartura de boas histórias. “O Brasil é país que gosto... Gostar é pouco, eu amo o Brasil. Quando chego aí eu quero ir para ruas e me inundar das pessoas”. Ele só não aprova muito o fato do seu livro “Terra Sonâmbula”, ser leitura indicada em vestibulares brasileiros. “Não me agrada muito que seja um livro obrigatório, me deixa constrangido”.

O escritor também compartilhou sua visão sobre os hábitos de leitura entre as novas gerações diante do uso demasiado da tecnologia, demonstrando seu receio de que haja perda de qualquer coisa: “não só técnica de se construir a escrita, mas na capacidade de se viver, de se usar a língua para criar e inventar”, concluiu. Para os jovens estudantes que se permitem sonhar com suas obras, Mia Couto deixou um recado: “para encantar o mundo é preciso saber se encantar”.

Para acompanhar a programação completa, basta acessar os canais da Fundação do Livro e Leitura: http://www.fundacaodolivroeleiturarp.com e canal do Youtube (FeiraDoLivroRibeirao).

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20ª FIL

A 20ª edição da FIL - Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto é realizada integralmente no formato on-line, entre os dias 20 e 29 de agosto. No ano passado, o evento foi adiado em função do avanço do Coronavírus (Covid-19) no país, mas foi anunciado com abrangência internacional a partir da sua 20ª edição. Por isso, recebeu recentemente nova nomenclatura e teve identidade visual reformulada.

Para 2021, diante da continuidade da crise sanitária, a decisão estratégica da organização do evento convergiu para realizá-lo no ambiente virtual, com transmissão ao vivo pela plataforma oficial da Fundação: http://www.fundacaodolivroeleiturarp.com e YouTube da instituição http://www.youtube.com/user/FeiraDoLivroRibeirao.

A Feira consagrou-se como um dos maiores eventos culturais do país: com 20 anos de história e 19 edições realizadas, já reuniu mais de 3 mil escritores e artistas com 6 milhões de leitores visitantes. Neste ano, a FIL contará com cerca de 60 atividades, durante 10 dias, e em torno de 110 horas de programação.
Realização

Ministério do Turismo, Secretaria Especial da Cultura, Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa, Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto e Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto apresentam:

A 20ª Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto conta com Patrocínio Diamante: GS Inima Ambient. Patrocínio Ouro: Alta Mogiana - Açúcar, Etanol e Energia; GasBrasiliano e Grupo São Francisco/Hapvida. Patrocínio Prata: Savegnago. Patrocínio Bronze: Passalacqua, Pedra Agroindustrial, Madeiranit e Riberfoods. Patrocínio: ACIRP - Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto, RibeirãoShopping e Usina São Martinho. Apoio: Baldocchi Assistência Familiar, Rápido D’Oeste LTDA., Ribeirão Preto|Região – Convention & Visitors Bureau, Santa Helena, SICOOB Cooperac, Grupo Utam, Grupo Via Brasil. Instituição Cultural: SESC. Apoio Cultural: ALMA – Academia Livre de Música e Artes, Biblioteca Lélia Abramo, Biblioteca Sinhá Junqueira, Centro Cultural Palace, Coderp, DE – Região de Ribeirão Preto, ETEC – José Martimiano da Silva/RP, Fundação Educandário, Fundação Dom Pedro II e Theatro Pedro II, Painew – Outdoor e Painéis, Secretaria Municipal da Educação, Secretaria Municipal da Cultura, Verbo Nostro Comunicação Planejada.

Realização Ministério do Turismo, Secretaria Especial da Cultura, Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria da Cultura e Economia Criativa, Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto e Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto.

Sobre a Fundação

A Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto é uma entidade de direito privado, sem fins lucrativos. Trata-se de uma evolução da antiga Fundação Feira do Livro, criada em 2004, especialmente para realizar a Feira Nacional do Livro da cidade. Hoje, é considerada a segunda maior feira a céu aberto do país. Em 2020, a Feira tornou-se internacional e entraria na 20ª edição. Por isso, recebeu recentemente nova identidade, apresentando-se como FIL (Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto), mas sua realização foi remarcada para agosto de 2021, devido à pandemia do novo Coronavírus.

Com uma trajetória sólida e projeção nacional e agora internacional, ao longo de seus 20 anos, a entidade ganhou experiência e, atualmente, além da Feira, realiza muitos outros projetos ligados ao universo do livro e da leitura, com calendário de atividades durante todo o ano. A Fundação se mantém com o apoio de mantenedores e patrocinadores, com recursos diretos e advindos das leis de incentivo, em especial do Pronac e do ProAc.

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